13 fevereiro, 2013

dia dos namorados


Vivo há uns anos com o meu gajo. Desde que começámos a passar tempo juntos nunca houve preocupação de nenhuma das partes em perceber o que eramos, nunca tivemos “a” conversa sobre o rumo das coisas ou de quais as intenções enterradas na sentimentalidade de cada um. Houve sempre, sim, muita transparência. Eu gostava dele, ele de mim, e por isso estávamos juntos. Combinávamos jantares, cafés, cinemas, copos (sozinhos ou com amigos), sem etiquetas de quem paga o quê ou de quem abre a porta a quem. Fomo-nos encantando um pelo outro no tempo que passávamos e acho que percebemos oficialmente que eramos namorados numa noite de copos em que a pergunta nos foi dirigida, entre risota geral o nosso segredo cúmplice tinha sido descoberto e a resposta mais que óbvia, sim. Nunca festejámos aniversários de casal, e ainda hoje quando me perguntam há quantos anos estamos juntos tento situar-me em acontecimentos paralelos da altura. Conversamos muitas vezes sobre as coisas que se passaram, com um brilhozito nos olhos, a nostalgia surge à luz dessas situações que vivemos e que deixam muitas saudades. Os amigos deixaram de se surpreender, à força do hábito, pelo nosso funcionamento. Mas ainda mandam uma ou outra laracha pelas noites especiais todas as semanas (às vezes mais do que uma vez por semana), noites reservadas apenas a nós, for no special reason, só porque sabe bem assim. Gostamos de conviver com os amigos, é algo de que nunca vamos prescindir. Mas também gostamos de estar sós, de viver momentos a dois, continuamos a rir que nem putos e a apanhar pielas juntos, a acarinhar-nos e apreciar quem está ao nosso lado. E claro que temos as nossas brigas, que não são bem brigas mas amuos, quando não cedo eu cede ele e vice-versa. Posso dizer que o amor ainda não parou de crescer, é uma planta. E que entre as relações que tive é a mais adulta por valorizar o essencial e deixar de fora o supérfluo.
Por toda a blogosfera aparecem os planos cor de rosa alheios para o dia dos namorados, as prendas fabulásticas para comprar à cara metade, os ursos pirosos nas montras, as frases foleiras escarrapachadas em cartões, os solteiros que saiem com solteiros para celebrar a “solteirice” e eu não vou mexer nem uma palha para alimentar esta loucura plástica de um dia instituído para ser “nosso” que não nos diz rigorosamente nada, nem diz rigorosamente nada sobre nós. Não preciso de um dia como o de amanhã para lhe dar coisas especiais, para lhe dizer coisas especiais ou para fazer coisas especiais. Já o fazemos durante os outros dias do ano. Está à vista nos gestos que trocamos, na nossa cumplicidade, intimidade, na vida que partilhamos. Por isso passaremos o dia de amanhã a ser o que somos, todos os dias. 

06 fevereiro, 2013

os meus cabelos brancos


Os meus primeiros cabelos brancos deram os seus ares de graça aos 24 anos. Foi uma herança passada pelo meu pai, que aos 20 já contava uma mão cheia deles na franja. 
Não sei se foi minha a autoria da descoberta, mas quando dei com eles (os brancos) adorava ficar plantada em frente do espelho. Os poucos fios perdiam-se por completo na imensa cabeleira (sempre tive e continuo a ter o cabelo comprido e muito denso), por isso gostava de resgatar aqueles três ou quatro e mimá-los qual Gollum do Lord of the Rings ("my preciouuusss"). Eram toda uma espécie diferente, um alienígena amistoso que tinha aterrado em cheio na minha cabeça. 
Recordo-me que ao relatar a novidade, a reacção devolvida por amigas do sexo feminino alternava entre o pânico absoluto (“horror”) e a piedade solidária (“coitadinha”). E também me recordo da S que, sem pudores, me aconselhava a fazer como ela: arrancar com a pinça os invasores brancos mal estes se atravessem a despontar. Tudo isto me parecia tontinho e completamente derivado de um fanatismo pelo politicamente correcto e pela eternidade da juventude.
A ver, é políticamente correcto e conveniente discursar sobre os aspectos positivos do envelhecimento, que o que importa mesmo é ter saúde, sentir-se bem na própria pele, focar nas coisas realmente importantes da vida. Coisas que a grande maioria de nós acredita, e bem, a 100%. Pergunto no entanto, onde está a causa de uma pessoa não se sentir bem na sua própria pele por ter cabelo branco? O que é que se extrai em parecer mais novo? Socialmente muito, claro. Talvez esteja aí o problema. Se existe a ideia generalizada de que ser jovem é bom (com os seus dissabores) e de que ser velho também o pode ser (com tantos ou ainda mais dissabores), onde começa e se prolonga a ilusão? A ilusão do querer parecer o que não se é. Por muito que nos tentemos convencer do contrário (e muito menos admitir), a velhice continua a ser uma assombração que (lá no fundo) ninguém quer ter por perto.
Não sou fundamentalista do naturalismo, e muito menos sou contra que cada um pinte a sua melena como bem lhe aprouver, desde que essa decisão seja consciente e individual. Não por convenção, por vergonha ou por os conhecidos(as) o fazerem.
Sei que me apela esta transformação física e adoro imaginar como será a minha farta cabeleira toda manchada de branco ou cinza. Também sei que, no momento em que me ache feia, pinto e pronto. Hoje, com 29 anos perdi a conta aos meus cabelos brancos e não preciso de os procurar, saltam bem à vista e competem com os outros.
No meio de tanto pensamento e ideias por formar, tenho só uma certeza. Não gostaria de ser, no futuro, uma mulher que, de tanto pintar, desconhece por completo o seu próprio cabelo.