27 janeiro, 2013

desempregada


Aquilo que algumas pessoas trabalhadoras ignora, ou na melhor das hipóteses acaba por esquecer, é que a vida de um desempregado (categoria na qual me insiro) não tem um horário delimitado. Com muita tristeza e frustração apercebo-me através de desabafos com amigos e conhecidos a pré-concepção de que o meu tempo é, na sua maior parte, livre de preocupações. Uma espécie de férias onde retiro uma hora aqui-outra hora ali para procurar ofertas. Onde me quedo passivamente a ponderar o sentido da existência e a curtir o conforto do lar.
Aquilo que não se recordam, ou nunca sentiram, é a urgência constante. Esta busca que começa a partir do momento que desperto e termina no momento em que encerro o computador e me vou deitar. As visitas cíclicas ao Iefp, aos Portais de emprego, aos Jornais, as centenas de candidaturas não respondidas, o palmilhar qual barata tonta instituições, empresas e associações  e acreditar – sempre a acreditar – que a presença física bate aos pontos a virtual, mesmo que por isso leve com sorrisos amarelos e desinteressados, olhares quase suplicantes para desaparecer, porque não há vagas nem dinheiro e talvez a realidade do desemprego não seja tão fácil de encarar ali no sítio onde tanto se trabalha. O candidatar a áreas que nada têm a ver com a minha formação, porque é mesmo assim que tem que ser, para sobreviver: não encalhar, não estagnar, não afundar. E ouvir comentários irreflectidos como “recepcionista? Andas a fazer imensas candidaturas para recepcionista... pronto é a tua cena”. E aproveito para explicar, não. Não é a minha “cena”, está a anos luz “da minha cena”, mas é uma opção, entre várias opções para as quais também me candidato. Ser lojista também não é. E por incrível que pareça, nenhuma das candidaturas que fiz para esse cargo foi bem sucedida. Ou ainda as sugestões que, apesar de bem intencionadas, são ingénuas como “andas mesmo a procurar em todo o lado? Tens de tentar. Já foste ao iefp? Estás inscrita? Porque não vais mesmo às empresas? Já fizeste candidaturas espontâneas? Não basta ires à empresas, tens que falar assim, falar assado, dizer isto, já fizeste?” E sim, já fiz, já disse, já fui. E sim, continuo a fazer, a dizer, a ir. E se não respondo mais a estas vossas perguntas, é porque estou saturada. Porque nelas há um implícito de não me andar a esforçar o suficiente, e para mim, sinceramente, é um murro na cara.

23 janeiro, 2013

aprende, estúpida #1

Conter o outro não é o mesmo que seres um contentor de lixo, e se o outro não consegue ver a diferença tens uma de duas escolhas:

1. traçar o limite

2. cagar e andar





Os debates ideológicos na blogosfera nunca deixam de surpreender, de tão visceralmente conduzidos. Transformam-se rapidamente em lutas estoicas de honra, com muita indignação, muito insulto, muita chapada simbólica. Seja zico, pêpa, crianças hiperactivas (do cronista Henrique Raposo). E acaba tudo a atirar pedras, querendo mostrar à viva força que a razão está no seu lado.

Vamos simplificar?

1. Há crianças hiperactivas? 
Sim.

2. Há erros de diagnóstico? 
Sim, chama-se negligência médica.

3. Falta de educação e hiperactividade são o mesmo? 
Não.

4. Há crianças mal educadas? 
Sim, muitas.

5. Os pais, não podendo receitar medicação, podem influenciar médicos a diagnosticar hiperactividade só para drogar as crianças e não terem que se chatear tanto? 
Até podem tentar, se o conseguirem voltamos à negligência médica.

6. Existem pais que desculpabilizam a má educação dos filhos com o rótulo de hiperactividade? 
Sim, há gente para tudo.

7. Deve-se pensar que todos os pais que dizem ter filhos hiperactivos estão a encobrir falta de educação?
Não.

8. Se a hiperactividade é um diagnóstico relativamente recente (e que antes era visto como simples má educação) significa que é inválido? 
Não, pergunto-me se alguém duvidaria (por exemplo) da esquizofrenia.


É mesmo preciso insistir na luta hiperactividade vs má educação? 
Deixem-se de merdas.


22 janeiro, 2013

Eu não sei que vento siberiano decidiu passar por cá, mas quando chegava a casa vinha com os dedos congelados e o nariz transformado em estalactite. Não sou nem nunca serei (espero) uma fundamentalista das estações, gosto muito de cada uma delas. Claro que achar uma certa piada ao Inverno não é o mesmo que estar mortinha por ficar ensopada com a chuva, e também não é o mesmo que amar de paixão o chapéu de chuva atrelado ao corpo como um apêndice. Mas pergunto, em que estação se poderia desbundar assim o sofá, estilo urso em hibernação, a babar nos filmes, os cobertores polares em cima, o gato ronronar nos pés, torradinhas e cacau quente. Quem não gosta de ter o papo quentinho virado para cima em plena apoteose da ronha, e prefere andar a espumar raiva ou indignação com a chegada de cada Inverno que vá ginasticar a frustração para o Holmes, ou sei lá, emigre.

Ai tanto drama


Um amigo ficou profundamente chocado por não existir cá em casa uma máquina de lavar louça. Entre várias coisas, apelou ao indispensável dos “bens de primeira necessidade” e de não estarmos “num país de terceiro mundo”. E eu que vivi, durante anos, com um fogão de dois bicos (de onde saíram deliciosos jantares para grupos de 10 e 15 amigos) pensei que estivesse na amena cavaqueira. Nop, não estava. 

se ouço esta idiotice mais uma vez acredito que me vá rebentar uma veia

Já li e ouvi tanta gente de peito cheio falar dos "doutores" e de como todos querem é ser "doutores" e que o problema de hoje em dia, dos números elevados do desemprego, vão desaguar ao nem todos podermos ser "doutores". Porque ao que parece ser "doutor" é uma coisa de gente tacanha e inútil que na verdade foi estudar porque não quer trabalhar. Não meus filhos, não estudem porque não vale a pena. Até porque esses "doutores" que nos tratam quando estamos doentes, que nos investigam novos tratamentos, que nos ajudaram a ter carrinhos, microondas, telemóveis, computadores, androides, incluindo o adoradíssimo facebook (um apanhado que em nada faz jus ao "doutor"), não servem mesmo para nada.
Já se passou muito tempo desde que escrevo nos blogues, antes gostava de o fazer. Chegava a casa com um formigueiro nos dedos. Poderia dizer que não me recordo do momento em que começaram a crescer grandes intervalos entre os textos, mas sei quando, como e na verdade isso pouco interessa. A vida muda, nem sempre para melhor ou pior. Muda apenas, e foi o que aconteceu. Escrever um texto implica permitir tempo a sós, e apesar de tempo em si ser algo que me sobra não o usei para isto.
É uma tentativa, é um voltar.